domingo, 20 de maio de 2007

Rato Cego

O rapaz tinha acabado de chegar áquele serviço, vindo de uma pequena secção na mesma fábrica.
Eram cerca de 90 homens que partilhavam o mesmo balneário, um mundo, comparado com os 10 (contando com ele) que antes, noutra parte da fábrica, partilhavam outra área parecida...mas mais pequena.
Era, apesar de ser conhecido por todos na fábrica, um novo elemento, visto como "bicho fanómico", uma novidade no balneário.

"Como é que vieste cá parar? Mandaram-te para cá agora?" - perguntaram-lhe os mais antigos."
"Não conseguiam aturar-me mais...nem o meu padrinho!" - respondia-lhes o rapaz. Gargalhadas soltas e sonoras logo pela manhã fazem sempre bem.

O pior estava para vir á hora do banho. O rapaz, que usava óculos, ficava ceguinho sem eles. No balneário antigo, este conhecia os cantos á casa e evitava os obstáculos (que via como sombras sem forma). Agora em casa nova...era o cabo dos trabalhos. Assim que sai do seu canto sem óculos a caminho do chuveiro, não consegue evitar um dos bancos corridos que estavam mais próximos de si e dá-lhe uma violenta pancada. Acerta em mais um ou dois até chegar a terreno aberto...e operário é terrível nestas coisas...

"Então,pá? Não vês o raio do banco?"
"Epá...sem óculos fico ceguinho..." - riposta o rapaz, tentando desviar-se das sombras que lhe causavam dor de cada vez que lhes batia.

Então, do fundo do balneário, algures no meio dos chuveiros e da multidão, ouve-se uma voz, gritando bem alto um nome que marcará o rapaz para sempre enquanto este estiver naquele serviço... "Ó RATO CEGO!!!". Mais uma gargalhada geral e o ar envergonhado como que a aceitar o seu novo "nome de guerra".

Desde então, o rapaz é conhecido pela alcunha de "Rato Cego", devido a nada ver sem óculos...